terça-feira, 27 de março de 2012

A ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS PARTIDOS POLÍTICOS - ATUALIZADO EM 15/02/2019

Série acadêmica

CONCEITO

Partido Político é uma forma de organização de um grupo social que se propõe a organizar, coordenar e instrumentalizar a vontade popular com o objetivo de exercer influência sobre a orientação política do país ou de assumir o poder e realizar o seu programa de governo.

ORIGEM E EVOLUÇÃO

Os partidos surgiram em decorrência da contraposição de comitês eleitorais, da criação de grupos parlamentares e do estabelecimento da ligação permanente entre os dois.

A partir da universalização do sufrágio, que requer entidades permanentes, os partidos se firmaram como instituições políticas indispensáveis à estrutura do Estado.

Guelfos e Gibelinos foram agrupamentos rivais italianos dos séc. XII ao séc. XV, partidários do Papa e dos imperadores germânicos na Itália, respectivamente.

Na França, surgiu o Clube Betrão, quando da reunião dos Estados Gerais na Constituinte de 1789, que depois se transformou nos Jacobinos. Outra facção deu origem aos Girondinos. Jacobinos: centralismo político e econômico do Estado (predominantemente católicos), liderados por Robespierre. Girondinos: moderados, liderados por Jacques-Pierre Bussot, defendiam a monarquia constitucional.

Na Inglaterra, no séc. XVII, antes da Revolução Gloriosa, surgiram os partidos da Corte e do Campo, transformando-se nos Tory Party e Whig Party. Tory: palavra de origem irlandesa (bandoleiro). O partido tem tendência conservadora, que reunia a aristocracia inglesa. Whig: palavra de origem escocesa, significando leite amargo (soro de leite) que alimentava os pobres. Estes partidos evoluíram para os partidos Conservador e Liberal, respectivamente. Após a Primeira Guerra Mundial, o Partido Liberal é substituído pelo Partido Trabalhista que permanece até hoje.

SITUAÇÃO BRASILEIRA

No Brasil, José Bonifácio, em discurso na Constituinte do Império, referiu-se às seguintes facções relativas à independência:

a) os Corcundos: queriam a independência, mas não a liberdade.
b) os Monárquico-constitucionalistas: queriam a liberdade com estabilidade. 
c) os Republicanos: ainda de pouca expressão, embrião do que ocorreu a partir de 1870.
d) os Federalistas: rejeitavam os Corcundos e os Monárquico-constitucionalistas e aceitavam os Republicanos.

A partir de 1826, com a criação da assembleia geral, foram organizados os seguintes grupos: os exaltados (anarquistas ou revolucionários, representados pelo povo), os moderados (conservadores) e os restauradores.

Entre 1834 e 1838, os exaltados agruparam-se no Partido Liberal e os moderados e restauradores uniram-se no Partido Conservador, os quais dominaram a cena política do Segundo Império. Em 1870, foi fundado o Partido Republicano.

Com a proclamação da República em 1889, o Partido Republicano foi dividido em Partidos Republicanos estaduais (PRP paulista, PRM mineiro, PRRG do Rio Grande do Norte, PRBa baiano, etc.).

Após a Revolução de 1930, criaram-se novos partidos, mas ainda de caráter regional: Partido Democrático em São Paulo; Partido Nacionalista em Minas Gerais; Partido Libertador no Rio Grande do Sul, além do Clube Três de Outubro e a Aliança Renovadora Nacional. Surgiu também o Partido Comunista Brasileiro.

Após a Constituição de 1946, com a consagração do sufrágio universal e do voto secreto, assegurou-se o modelo proporcional para a eleição dos deputados. Assim, houve um florescimento do sistema partidário até 1965, com a criação do Partido Social Democrático (PSD), liderado por interventores estaduais do governo Vargas, a União Democrática Nacional (UDN), forças de oposição à Vargas, o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), incentivado pelo próprio Vargas, além de pequenos partidos, como PDC e PL, de bases regionais, e do PCB, na clandestinidade após 1948.

Esses partidos foram extintos em 1965 pelo Ato Institucional nº 2. Neste mesmo ano, o Ato Institucional nº 4 impõe o bipartidarismo representado pela Aliança Renovadora Nacional (ARENA), formada pela situação, e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), de oposição. Ambos foram extintos pela Lei 6.767 de 1979, que deu origem à reorganização partidária. Ainda em 1965, foi sancionado o Código Eleitoral Brasileiro, Lei 4.737, que, com suas várias alterações posteriores, trouxe muitas inovações, dentre elas, o modelo de preenchimento das vagas nas eleições proporcionais, em seus arts. 106 ao 109, a propósito da demonstração do ANEXO I.

Cerca de vinte partidos regularizaram-se junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), conforme demonstraram as eleições de 1994, 1998 e 2002, com pequenas mudanças. Em 2006, dos trinta e dois partidos, vinte e um conseguiram representação na Câmara dos Deputados, apresentando cinco grandes formações partidárias. A primeira formada pelas grandes agremiações: Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), Partido dos Trabalhadores (PT), Partido da Frente Liberal (PFL), Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e Partido Progressista (PP), possuindo 89, 83, 65, 65 e 42 deputados federais, respectivamente; cinco partidos médios: Partido Socialista Brasileiro (PSB), Partido Democrático Trabalhista (PDT), Partido Liberal (PL), Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e Partido Popular Socialista (PPS), ex-PCB, com 27, 24, 23, 22 e 21 deputados cada; três partidos pequenos: Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Partido Verde (PV) e Partido Social Cristão (PSC), com 13, 13 e 9 deputados; oito minipartidos: Partido Trabalhista Cristão (PTC), – antigo Partido da Reconstrução Nacional (PRN), ao qual pertencia o ex-presidente Fernando Collor de Mello –, Partido da Mobilização Nacional (PMN), Partido Socialismo e Liberdade (P-Sol), Partido da Reedificação da Ordem Nacional (PRONA), Partido Humanista Social (PHS), Partido dos Aposentados Nacionais (PAM), Partido dos Trabalhadores do Brasil (PT do B) e Partido Republicano Brasileiro (PRB), com 4, 3, 3, 2, 2, 1, 1 e 1 deputados cada um; e, finalmente, onze micropartidos: Partido Social Democrático (PSD), Partido Social Trabalhista (PST), Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU), Partido Trabalhista Nacional (PTN), Partido Republicano Trabalhista (PRT), Partido Republicano dos Trabalhadores Brasileiros (PRTB), Partido Geral dos Trabalhadores (PGT), Partido Social Liberal (PSL), Partido Social Democrata Cristão (PSDC), Partido Comunista Brasileiro (PCB), Partido Republicano Progressista (PRP) e Partido da Causa Operária (PCO), sem nenhum representante na Câmara Federal.

Desses partidos, apenas sete: PMDB, PT, PSDB, PFL, PDT, PP e PSB conseguiram ultrapassar a “cláusula de barreira” (Lei 9.096 de 1995), que foi suspensa por decisão cautelar do STF, em 07/12/2006.

Os Democratas (DEM) foram criados em março de 2007, em substituição ao PFL, que fora formado em 1985 de uma dissidência do Partido Democrático Social (PDS), um dos que sucederam a ARENA. O PP, fundado em 2003, a partir do Partido Progressista Brasileiro (PPB), de 1995, é outra linhagem dissidente do PDS. Nota-se que a mudança de nomes das agremiações partidárias é uma constante na cultura política do País, talvez até para se fazerem esquecidas perante os eleitores pelos atos impopulares defendidos, instituídos e praticados no passado.

No ano de 2012, eram 30 partidos, 22 representados na Câmara Federal, segundo a seguinte configuração: quatro grandes partidos: PT, PMDB, PSDB e PSD – este recriado em 2011 por iniciativa de dissidentes do DEM, em sua maioria –, com 85, 76, 53 e 47 deputados federais, respectivamente; seis partidos médios: PP, PR (Partido da República, formado em maio de 2006 da fusão do PRONA com o PL), PSB, DEM, PDT e PTB, com 39, 36, 28, 27, 26 e 21 deputados; cinco pequenos partidos: PSC, PCdoB, PPS, PRB e PV, com 17, 13, 11, 10 e 10 deputados; oito minipartidos: P-Sol, PT do B, PMN, PSL, PHS, PRTB, PRP e PTC, com 3, 3, 2, 1, 1, 1, 1 e 1 deputados; e seis micropartidos sem representação na Câmara de Deputados: PSTU, PCB, PSDC, PCO, PTN, PPL (Partido da Pátria Livre, criado em outubro de 2011) e PEN (partido Ecológico Nacional, criado em junho de 2012).



Em 2018, constavam registrados no TSE 35 partidos, 25 deles com representação na Câmara Federal, conforme configuração seguinte: seis grandes agremiações: PT, MDB (mudança de nome em maio de 2018, a partir do PMDB)PP, PSDB, DEM e PR, com 61, 51, 50, 49, 43 e 40 deputados federais, respectivamente; três médios partidos: PSD, PSB e PRB (Republicanos, a partir de fevereiro de 2014), com 37, 26 e 21 deputados; seis pequenos partidos: PDT, PODE (Podemos, criado em maio de 2017 a partir do PTN), PTB, PROS (Partido Republicano da Ordem Social, instituído em setembro de 2013), SD (Solidariedade, aprovado em setembro de 2013) e PCdoB, com 19, 17, 16, 11, 10 e 10 deputados; dez minipartidos: PSC, PSL, PPS, P-Sol, PATRIOTA (instituído em abril de 2018, pela mudança de nome do PEN), AVANTE (criado em setembro de 2017, pela mudança de nome do PT do B), PV, PHS, REDE (Rede Sustentabilidade, criado em setembro de 2015) e PPL, com 9, 8, 8, 6, 5, 5, 4, 4, 2 e 1 deputados; e dez micropartidos sem representação na Câmara dos Deputados: PSTU, PCB, DC (mudança de nome em maio de 2018, a partir do PSDC), PCO, PTC, PMN, PRTB, NOVO (Partido Novo, instituído em setembro de 2015), PMB (Partido da Mulher Brasileira, fundado em setembro de 2015) e PRP.

Atualmente, estão registrados no TSE 34 partidos, porém, aumentando para 30 os representados na Câmara Federal, conforme esta configuração: duas grandes agremiações: PT e PSLcom 54 deputados federais cada um; nove médios partidos: PP, PSD, MDB, PR (PL, mudança proposta em fevereiro de 2019), PSB, PSDB, Republicanos, PDT e DEM, com 37, 35, 34, 33, 32, 30, 30, 28 e 27 deputados; quatro pequenos partidos: SD, PTB, PODE e P-Sol, com 13, 11, 11 e 10 deputados; quinze minipartidos: PCdoB, PSC, PPS, NOVO, PROS, PATRIOTA (incorporando o PRP por mudança proposta em novembro de 2018)AVANTE, PHS, PV, PMN, PTC, REDE, PPL e DC, com 9, 8, 8, 8, 8, 8, 7, 6, 4, 3, 2, 1, 1 e 1 deputados; e cinco micropartidos sem representação na Câmara dos Deputados: PSTU, PCB, PCO, PRTB e PMB.

Já em relação ao Senado Federal, 15 partidos possuíam, em 2012, representação na Casa, observando-se o seguinte quadro: primeiro grupo: PMDB, PT e PSDB, com 19, 13 e 10 senadores, respectivamente; segundo grupo: PR, PTB, PDT, DEM e PP, com 6, 6, 5, 5 e 5 senadores; terceiro grupo: PSB, PSD e PC do B, com 4, 2 e 2 senadores; e o quarto grupo: PRB, PSC, P-Sol e PV, cada partido possuindo um senador.

Em agosto de 2018, o Senado Federal possuía uma representação segundo esta configuração: primeiro grupo: MDB, PSDB e PT, com 18, 12 e 9 senadores, respectivamente; segundo grupo: PP, DEM, PODE e PSD, com 6, 5, 5 e 5 senadores; terceiro grupo: PSB, PR, PDT e Republicanos, com 4, 4, 3 e 2 senadores; e o quarto grupo: PTB, PC do B, PPS, PROS, PTC, PV e REDE, em que cada partido possui um senador em seus quadros. Além disso, havia um senador sem partido.

Hoje, no Senado, consta a seguinte representação: primeiro grupo: MDB, com 13 senadores; segundo grupo: PSD, PODE, PSDB, PT, PP e DEM, com 9, 8, 8, 6, 6, e 5 senadores respectivamente; terceiro grupo: PDT, PSL, REDE, PPS, PROS, PSB e PL, com 4, 4, 4, 3, 3, 3 e 2 senadores; e, com 1 (um) senador cada partido, o quarto grupo: Republicanos e PSC. Além disso, há um senador sem partido.


ANEXO I

PREENCHIMENTO DAS VAGAS NAS ELEIÇÕES PROPORCIONAIS
Lei 4.737 de 1965 (CÓDIGO ELEITORAL BRASILEIRO - CE)
Arts. 106 ao 109 do CE
EXEMPLO

Vagas para Deputado Federal

1.900.000 votos válidos de um Estado com 8 (oito) vagas (sem votos brancos e nulos).

Cálculo do quociente eleitoral (art. 106 do CE)

Votos válidos: 1.900.000
Vagas: 8
1.900.000 ÷ 8 = 237.500 (Quociente eleitoral)

Cálculo do quociente partidário ou do número de candidatos eleitos (art. 107 do CE):

Coligação A = 750.000 votos
Coligação B = 700.000 votos
Partido C = 450.000 votos

Legenda partidária
Votos
Cálculo
Resultado
Quociente partidário
Coligação A
750.000
750.000 ÷ 237.500
3,16
3
Coligação B
700.000
700.000 ÷ 237.500
2,95
2
Partido C
450.000
450.000 ÷ 237.500
1,89
1

De acordo com o art. 108 do CE, estarão eleitos os candidatos mais votados em cada partido ou coligação, que tenham obtido um número de votos 10% (dez por cento) ou mais do quociente eleitoral – 23.750 votos ou mais –, tantos quanto o quociente partidário indicar, na ordem de votação que cada um tenha recebido.

Foram preenchidas 6 (seis) vagas nesta fase, restando 2 (duas) vagas remanescentes.

Cálculo da primeira vaga restante a partir das sobras (art. 109, I e II, do CE):

Legenda partidária
Quociente partidário
Quociente partidário + 1
Resultado
Coligação A
3
4
750.000 ÷ 4 = 187.500
Coligação B
2
3
700.000 ÷ 3 = 233.333
Partido C
1
2
450.000 ÷ 2 = 225.000

Cálculo da segunda vaga restante:

Legenda partidária
Quociente partidário
Quociente partidário + 1
Resultado
Coligação A
3
4
750.000 ÷ 4 = 187.500
Coligação B
2 + 1 = 3
4
700.000 ÷ 4 = 175.000
Partido C
1
2
450.000 ÷ 2 = 225.000

A Coligação B obteve, então, uma vaga restante e o Partido C a outra, observada a exigência de votação nominal mínima do partido ou coligação de 23.750 votos.

Conforme o art. 109, III, do CE, caso ainda reste alguma vaga, e a votação mínima não seja mais atingida, as cadeiras serão distribuídas aos partidos ou coligações que obtiverem as maiores médias.



REFERÊNCIAS

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 26ª ed., São Paulo: Malheiros, 2011.

BRASIL. Código Eleitoral. Lei Federal nº 4.737 de 1965. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4737.htm>. Acesso em: 09/08/2018.

______. Tribunal Superior Eleitoral. Partidos políticos registrados no TSE. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/registrados-no-tse>. Acesso em: 15/02/2019.

______. Tribunal Superior Eleitoral. Histórico dos partidos políticos. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/arquivos/tse-historico-partidos-politicos>. Acesso em: 15/02/2019.

______. Câmara Federal. Bancada na Câmara (eleição e posse). Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/deputados/pesquisa/bancadas/bancada-atual>. Acesso em: 15/02/2019.

______. Senado Federal. Senadores e senadoras em exercício. Disponível em: <https://www25.senado.leg.br/web/senadores/em-exercicio/-/e/por-partido>. Acesso em: 15/02/2019.

DANTAS, Sivanildo de Araújo. Direito eleitoral: teoria e prática do procedimento das eleições brasileiras. Curitiba: Juruá, 2004.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 34ª ed., São Paulo: Malheiros, 2011.

segunda-feira, 19 de março de 2012

FICHAMENTO DE TEXTO: "A ESSÊNCIA DA CONSTITUIÇÃO"

Série acadêmica

FICHAMENTO do livro LASSALE, Ferdinand. A Essência da Constituição. 5. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2000.

INTRODUÇÃO

Afirma que a verdadeira ciência é a clareza de pensamento.

SOBRE A CONSTITUIÇÃO

O que é uma Constituição? Para um jurisconsulto, “Constituição é um pacto juramentado entre o rei e o povo, estabelecendo os princípios alicerçais da legislação e do governo dentro de um país”. Conceito jurídico exterior que não explica a essência constitucional.

Qual a essência da Constituição? Para responder, faz-se necessário um método de comparação com algo já conhecido, a lei.

A Constituição, apesar de também ser aprovada pelo legislativo, não é uma simples lei. É a lei fundamental da nação que se diferencia das demais, pois possui três requisitos: lei básica; fundamento das outras leis, atuando e irradiando-se por meio das leis comuns; lei baseada na noção de necessidade real.

Constituição é uma força ativa que faz com que todas as outras leis vigentes no país sejam o que são realmente por uma exigência da necessidade. Assim promulgada, não se pode decretar outras leis contrárias às suas determinações.

FATORES REAIS DO PODER

A força ativa e eficaz citada se traduz nos fatores reais do poder (Monarquia, Aristocracia, Grande Burguesia, Banqueiros, Pequena Burguesia, Classe Operária, Consciência Coletiva e a Cultura Geral) que atuam no âmbito da sociedade e que informam todas as leis vigentes, determinando que possam ser, substancialmente, como elas são.

INSTITUIÇÕES JURÍDICAS

A essência da Constituição é, portanto, a soma dos fatores reais do poder que regem uma nação. Juntando-se estes fatores e, através dos processos legislativos, escrevendo-os em uma folha de papel, tem-se o verdadeiro direito ou as instituições jurídicas. Desta forma, lá se encontram, implícita e diplomaticamente, todos os anseios dos atores sociais.

PODER ORGANIZADO E PODER INORGÂNICO

O exército, instrumento de poder político, é disciplinado e está organizado para ser utilizado a qualquer momento pelo governante.

O poder do povo ou da nação (inorgânico) é desorganizado. Isso explica por que uma força organizada pode sustentar-se por anos, reprimindo o poder muito mais forte do país.

CONSTITUIÇÃO REAL E EFETIVA

Todos os países possuem ou possuíram uma Constituição real e efetiva, porquanto em todos eles existem os fatores reais do poder, quaisquer que sejam.

No Estado moderno, surge, em um momento de sua história, uma Constituição escrita como resultado de transformações ocorridas nesses fatores reais de poder. Foi o que se observou nas passagens do Feudalismo para o Absolutismo e, deste, para a Revolução Burguesa.

Quando uma constituição escrita é boa e duradoura? Quando corresponder à Constituição real e verdadeira, ou seja, fincada nos fatores de poder que regem o país.

O PODER DA NAÇÃO É INVENCÍVEL

O poder da nação é invencível, mas desorganizado e retórico, diferentemente do poder do rei com seu exército, que é prático e disciplinado. Somente em momentos históricos, em aglutinações de esforços, o poder do povo obtém êxito.

A Revolução Prussiana de 1848 foi um desses momentos, que demandou uma nova Constituição. Consequências:
   1 - a Assembleia Nacional, pressionada, evitou substituir os fatores reais do poder e transformar o exército num instrumento da nação.
   2 - a Assembleia foi dissolvida, mas o rei proclamou a Constituição da forma que se encontrava, não sendo cumprida.
  3 - o fato de partidos defenderem publicamente a Constituição é um sinal da sua vulnerabilidade e fragilidade.

CONCLUSÕES PRÁTICAS

Constata que os problemas constitucionais são de poder e não de direito. A verdadeira Constituição se origina dos fatores reais e efetivos do poder, sendo duradouras e de valor as constituições escritas que exprimem estes fatores.

FICHAMENTO DE TEXTO: "NEOCONSTITUCIONALISMO E CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO"

Série acadêmica

FICHAMENTO do texto "Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do Direito (O triunfo tardio do direito constitucional no Brasil)", p. 203-249, In: BARROSO, L. Roberto. A Constitucionalização do Direito: Fundamentos Teóricos e Aplicações Específicas. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007.

INTRODUÇÃO
Diante da velocidade das mudanças atuais, o Direito está em crise existencial, sem conseguir restituir à sociedade os produtos de sua reputação: justiça e segurança pública.

NEOCONSTITUCIONALISMO E AS TRANSFORMAÇÕES DO DIREITO CONSTITUCIONAL CONTEMPORÂNEO
         Marco histórico: a reconstitucionalização da Europa, após a Segunda Grande Guerra, restabeleceu a Constituição e a importância do direito constitucional sobre as instituições.
As principais referências foram a Lei Fundamental de Bonn, de 1949, e a criação do Tribunal Constitucional Federal, de 1951, seguidas da Constituição da Itália, de 1947, com a instalação da Corte Constitucional em 1956.
No Brasil, a Constituição de 1988 foi capaz de fazer a travessia do regime autoritário para o Estado democrático de direito. Suportou variados testes institucionais, desde o “impeachment” de um Presidente à eleição de outro de oposição, do Partido dos Trabalhadores.
Em menos de uma geração, o direito constitucional no Brasil passou do desprestígio ao apogeu.
Marco filosófico: sob o rótulo genérico do pós-positivismo, o novo direito constitucional procura superar os modelos puros do jusnaturalismo e do positivismo.
O pós-positivismo se propõe a ir além da legalidade escrita, sem desprezar o direito posto, e busca uma leitura moral do Direito, sem recorrer à metafísica.
Neste paradigma em construção, abrigam-se a normatividade aos princípios e a definição de suas relações com valores e regras; a reabilitação da razão prática e da argumentação jurídica; a formação de uma nova hermenêutica constitucional; e uma teoria dos direitos fundamentais. Há, assim, uma reaproximação entre o Direito e a filosofia.
Marco teórico: evidenciado a partir de três grandes inovações.
1) A força normativa da Constituição – o reconhecimento da força normativa, do caráter vinculativo e imperativo de suas disposições passou a ser premissa do estudo constitucional.
Com resistências, esse debate só chegou ao Brasil na década de 1980. Coube à Constituição de 1988, além da doutrina e da jurisprudência a partir dela, o mérito de vencer as barreiras mais atrasadas.
2) A expansão da jurisdição constitucional – após 1945, um novo modelo, inspirado na experiência americana, constitucionalizava os direitos fundamentais e os imunizava em relação ao processo político majoritário, cabendo tal proteção ao judiciário.
O controle de constitucionalidade, associado aos tribunais constitucionais, foi irradiado na Europa continental, nos anos 50, a partir da Alemanha e da Itália.
No Brasil, esse controle expandiu-se com a referida Constituição, ampliando o direito de propositura junto ao Supremo Tribunal Federal, que exerce esse controle via ações de sua competência própria; recurso extraordinário; e em processos objetivos, em que se veiculam as ações diretas (de inconstitucionalidade, declaratória de constitucionalidade, de inconstitucionalidade por omissão, arguição de descumprimento de preceitos fundamental e a interventiva).
3) A nova interpretação constitucional – no novo sistema, verificou-se que, quanto ao papel da norma, só o relato do texto não é decisivo para a solução dos problemas jurídicos; e, quanto ao papel do juiz, ele já não se limita à função de conhecimento técnico do enunciado normativo, é coparticipante do processo de concreção da norma, quer dizer, da criação do Direito.
As mudanças requeridas na nova interpretação são ilustradas nas categorias que se seguem:
a) cláusulas gerais: são conceitos jurídicos indeterminados que, contendo expressões abertas, produz um início de significação a ser completado pelo intérprete, no caso concreto;
b) princípios: são considerados pelo pós-positivismo normas que consagram determinados valores ou apontam fins públicos a serem realizados por variados meios. Impõe-se a atuação do intérprete na definição concreta do seu sentido e alcance;
c) colisões de normas constitucionais: quando duas normas de igual hierarquia se colidem, é normal que não possam resolver, de logo, o problema. É aí que se insere o juiz, criando o Direito aplicável concretamente ao caso;
d) ponderação: técnica usada pelo intérprete, quando das colisões de normas constitucionais, em que ele faz concessões recíprocas, preservando o máximo de cada interesse, ou escolhendo o direito prevalente, no concreto, para melhor realizar o desejo constitucional. Nesta categoria, o uso do princípio da razoabilidade é determinante;
e) argumentação: controle de racionalidade das decisões proferidas, sob ponderação, nos casos que comportam mais de uma solução possível e razoável. O juiz deve reconduzir a interpretação sempre ao sistema jurídico; utilizar-se de uma fundamentação que tenha a pretensão de universalidade; e levar em conta os efeitos de sua decisão no mundo real.

A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO
Os princípios e disposições constitucionais passam a condicionar normas do direito infraconstitucional. A atuação entre os três Poderes, suas relações com os particulares, assim como as relações entre os particulares são repercutidas pela constitucionalização.

ORIGEM E EVOLUÇÃO DO FENÔMENO
A aproximação entre constitucionalismo e democracia, a força normativa da Constituição e a difusão da jurisdição constitucional foram processos de passagem para o modelo atual.
Nos Estados Unidos, a constitucionalização do sistema jurídico e o controle de constitucionalidade, desde o final do século XVIII, inspiraram todo o movimento contemporâneo.
A Alemanha do pós-guerra foi o marco inicial desse processo de constitucionalização, com a Lei Fundamental e o Tribunal Federal, em que os direitos fundamentais, além de terem a função de proteger as situações individuais, desempenharam o papel de instituir uma ordem objetiva de valores. Essas normas constitucionais impregnaram todos os ramos do Direito, público e privado (notadamente o civil), e vincularam os Poderes estatais.
Na Itália, a Constituição entra em vigor em 1948, mas a constitucionalização das normas só se inicia na década de 1960, com a efetividade da Corte Constitucional, quando se manifesta em decisões de inconstitucionalidade, em convocações para atuação do Legislativo e na reinterpretação de normas infraconstitucionais, e quando as normas de direitos fundamentais passaram a ser aplicadas sem a intermediação do legislador.
Na França, o processo ainda está em fase de afirmação, pois a Constituição de 1958 optou por um controle só para algumas leis, mas antes de entrarem em vigor, feito pelo Conselho Constitucional, o que não se constitui uma jurisdição. Entretanto, começam a ser debatidos a impregnação da ordem jurídica pela Constituição e o uso da técnica de interpretação constitucional, apesar da grande resistência da doutrina tradicional.

CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO NO BRASIL
O texto final da Constituição de 1988 expressa a soma dos fatores reais de poder possível e circunstancial, carregada de paternalismos, reservas de mercado e privilégios corporativos. A euforia levou a uma Carta prolixa e corporativa, em que os principais ramos do direito infraconstitucional foram contemplados.
Quando princípios e regras de uma disciplina ascendem à Constituição, passam a subordinar as demais normas daquele subsistema, interferindo nos limites de atuação do legislador ordinário, assim como na interpretação do Judiciário.
Dotada de supremacia formal e material, a Constituição está hoje no centro do sistema jurídico, funcionando como critério de validade e vetor de interpretação de toda ordem infraconstitucional.
A constitucionalização do Direito impõe ao legislador e ao administrador deveres negativos e positivos de atuação, propondo limites e objetivos a serem observados. Todavia, é na jurisdição constitucional que está a sua principal manifestação, a qual é exercida por juízes e tribunais, difusamente, e pelo STF, concentradamente, envolvendo diferentes técnicas interpretativas:
a) reconhecimento da revogação das normas inferiores, anteriores e incompatíveis com a Constituição;
b) declaração de inconstitucionalidade de normas inferiores, posteriores e com ela incompatíveis;
c) declaração da inconstitucionalidade por omissão e convocação à atuação do legislador;
d) interpretação conforme a Constituição, quer dizer:
   i) entendimento da norma inferior que melhor traduza os valores e fins constitucionais;
  ii) declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução do texto, retirando uma interpretação possível e afirmando uma outra compatível com a Constituição.
Ao Judiciário compete invalidar um ato do Legislativo, porém não pode substituí-lo por um ato de vontade própria, ou seja, ele só pode atuar como legislador negativo.

ALGUNS ASPECTOS DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO
      DIREITO CIVIL
Na Revolução Francesa, a Constituição era a Carta Política que regia as relações entre o Estado e o cidadão, já o Código Civil ou napoleônico era o documento jurídico a reger as relações entre particulares. Este realizava o ideal burguês que protegia, além da igualdade formal, a propriedade e a liberdade de contratar.
Com o Estado social e a crítica à desigualdade material, o poder público começa a interferir nas relações particulares, ao introduzir as normas de ordem pública e proteger o lado mais fraco da relação jurídica. É o dirigismo contratual, que publiciza o direito privado, em especial o civil.
Na fase atual, a Constituição, com suas regras e princípios, se coloca no centro do ordenamento jurídico, merecendo destaque duas considerações: primeira, o princípio da dignidade da pessoa humana que impõe limites e atuações positivas ao Estado, no atendimento das necessidades básicas, em que o direito civil é repersonalizado e despatrimonializado.
Segunda, a aplicabilidade dos direitos fundamentais às relações privadas. Prevalece na doutrina brasileira a eficácia direta e imediata da aplicação das normas constitucionais a essas relações, mediante ponderação dos princípios constitucionais e o direito fundamental do caso concreto.
      DIREITO ADMINISTRATIVO
Este ramo do Direito desenvolveu-se com autonomia e agregou a disciplina da Administração Pública, dado o prestígio do Conselho de Estado Francês.
A Constituição de 1988 discorre vastamente sobre a Administração Pública, contendo, inclusive, o estatuto dos servidores públicos, assim como os princípios setoriais do direito administrativo, que são os da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
A partir da importância da dignidade humana e da defesa dos direitos fundamentais, alterou-se a qualidade das relações entre Administração e administrado, quebrando paradigmas:
a)   a redefinição da supremacia do interesse público sobre o interesse privado primário (justiça, segurança e bem-estar social) e o secundário (interesse da pessoa jurídica de direito público). Este último jamais terá supremacia sobre o interesse particular. Se entrarem em colisão, caberá ao intérprete proceder à ponderação sob a ótica das normas e fatos relevantes para o caso concreto.
b)   a vinculação do administrador à Constituição e não apenas à lei ordinária. Ele deve ter por fundamento a Constituição, independentemente de qualquer manifestação do legislador ordinário. O princípio da legalidade transforma-se em princípio da constitucionalidade.
c)   a possibilidade de controle judicial do mérito do ato administrativo, que se limitava a cognição dos juízes e tribunais aos aspectos da sua legalidade e não do seu mérito. Segundo o autor, já não é mais assim, pois os princípios constitucionais gerais já mencionados, e também os específicos, como moralidade, eficiência e razoabilidade/proporcionalidade, permitem o controle da discricionariedade administrativa.
      DIREITO PENAL
O direito constitucional repercute de maneira ampla, direta e imediata sobre o direito penal, incluindo um denso catálogo de garantias e impondo ao legislador a ação positiva e negativa em relação à criminalização de condutas.
Os bens jurídicos constitucionais se colocam em uma ordem hierárquica, em que a gravidade da punição deve ser regulada por essa lógica. O direito penal não deve ir além nem aquém do ideal na proteção desses valores.

CONSTITUCIONALIZAÇÃO E JUDICIALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES SOCIAIS
A difusão da Lei Maior pelo ordenamento se faz pela jurisdição constitucional, que, no Brasil, é de competência ampla do juiz estadual ao STF.
Com a constitucionalização, aumento da demanda por justiça e ascensão institucional do Judiciário, verificou-se uma significativa judicialização de questões políticas e sociais, demandando os tribunais sobre temas como: políticas públicas, relações entre Poderes, direitos fundamentais e questões cotidianas das pessoas.
Os membros do Poder Judiciário são selecionados por mérito e conhecimento específico, não são eleitos. Entretanto, o poder dos juízes e tribunais é representativo e exercido em nome do povo e a ele deve contas.
Cabe ao Judiciário resguardar os valores fundamentais e os padrões democráticos, além de garantir a estabilidade institucional.
A Constituição protege os direitos fundamentais, determina a adoção de diretrizes para realizá-los bem como delega o investimento de recursos e políticas a serem seguidas no devido tempo ao legislador e administrador; porém, o controle de constitucionalidade de políticas públicas ainda não foi pacificado pela doutrina.
No Brasil, só recentemente tem-se potencializado estudos sobre o equilíbrio entre supremacia da Constituição, interpretação constitucional pelo judiciário e processo político majoritário. As nossas circunstâncias atuais reforçam a importância do STF, inclusive na crise de legitimidade por que passam o Legislativo e o Executivo como uma crônica disfunção institucional.

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